Queimadas e desmatamento ameaçam plantas endêmicas do Cerrado em Cristalina, Goiás. Pesquisadores trabalham para preservar espécies nativas e recuperar o bioma
Cristalina, cidade goiana situada a 130 quilômetros de Brasília, abriga uma rica diversidade de espécies nativas do Cerrado, incluindo plantas únicas que não são encontradas em nenhum outro lugar do mundo. Com um solo característico e uma altitude elevada, o município oferece um ambiente ideal para espécies adaptadas às condições locais. Porém, a crescente expansão urbana, o desmatamento e o avanço das queimadas colocam essas espécies em risco.
Em uma visita recente à fazenda Recanto dos Cristais, uma área de preservação em Cristalina, o biólogo Marcelo Simon, da Embrapa, destacou três plantas endêmicas e ameaçadas de extinção que chamam a atenção dos pesquisadores. Entre elas, a Jacaranda intricata, pertencente à mesma família dos ipês, foi severamente impactada pelas queimadas que atingiram o Cerrado este ano, desaparecendo antes que as sementes pudessem ser coletadas para estudos e preservação. “O Cerrado é adaptado ao fogo, mas a alta frequência de incêndios é uma grande ameaça à flora local”, alerta Simon.
De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Cerrado já perdeu 31,6% de sua cobertura vegetal este ano, índice que só fica atrás da Amazônia em número de queimadas. A biodiversidade do bioma, que inclui mais de 12 mil espécies, é cada vez mais ameaçada, reforçando a urgência de medidas de proteção e recuperação.
Conservação e Coleta de Sementes
Uma das principais estratégias de preservação adotadas pelos pesquisadores da Embrapa é a coleta de sementes de espécies ameaçadas. Essas sementes são armazenadas em câmaras frias ou cultivadas in vitro, conforme sua resistência ao congelamento, e formam um banco genético vital para a conservação da flora brasileira. Com cerca de 119 mil amostras vegetais de 1.117 espécies, a Embrapa detém a maior coleção de espécies da América Latina.
Além disso, para plantas raras ou que aparentam ser inéditas, os cientistas coletam amostras que são posteriormente desidratadas e armazenadas em herbários. Este processo permite a catalogação e o estudo aprofundado das espécies, identificando novas plantas e garantindo que a biodiversidade do Cerrado continue sendo documentada e preservada.
Conscientização e Preservação do Cerrado
Marcelo Simon reforça a importância de preservar áreas intactas do Cerrado, uma vez que a recuperação do bioma é complexa e exige o uso de plantas nativas, cuja adaptação depende das condições de solo e clima específicos. Ele explica que, embora a floresta amazônica seja amplamente conhecida, o Cerrado é igualmente rico em biodiversidade e precisa de mais atenção e conscientização pública. “Se falamos em áreas naturais de grande biodiversidade, muitos pensam na floresta, mas o Cerrado também é um dos biomas com alta relevância para a conservação”, afirma.
Em Cristalina, mais de 68% da vegetação natural foi perdida, e áreas de proteção ambiental ainda são limitadas. Algumas propriedades privadas, como a fazenda Recanto dos Cristais, desempenham um papel crucial na preservação da vegetação do Cerrado, protegendo 800 hectares de biodiversidade. Propriedades como essa são exemplos de como o setor privado pode colaborar com a conservação ambiental, mantendo áreas preservadas e limitando atividades de impacto.
Projetos de Recuperação do Bioma Cerrado
O projeto da Embrapa em Cristalina faz parte do Plano de Ação Territorial Veredas Goyaz-Geraes, uma iniciativa destinada à preservação de espécies ameaçadas, envolvendo 33 municípios nos estados de Goiás e Minas Gerais. Coordenado por órgãos ambientais estaduais e com apoio de ONGs e instituições de pesquisa, o projeto é um esforço conjunto para resguardar a flora única do Cerrado e conscientizar a população sobre a importância desse bioma.
Com o apoio do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) e do Ministério do Meio Ambiente, o programa Pró-Espécies contribui para a preservação da diversidade no Cerrado e reforça a urgência de ações que revertam o cenário de degradação ambiental. A colaboração entre instituições e o envolvimento da comunidade são fundamentais para garantir que o Cerrado e sua biodiversidade sobrevivam para as próximas gerações.
Em tempos de alta devastação, Cristalina se torna um símbolo da luta pela preservação do Cerrado e da importância de aliar desenvolvimento sustentável à conservação ambiental.
Por: Redação
Foto: Divulgação