Pressões do mercado, hesitação política e um governo refém da falta de alinhamento técnico
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a expor um traço recorrente na política brasileira: a improvisação. O mais recente episódio envolveu o anúncio de aumento do IOF para aplicações financeiras no exterior, inclusive fundos exclusivos, seguido de um recuo parcial poucos dias depois. A medida acabou restringida a pessoas físicas que realizam operações cambiais cotidianas, como compras e viagens internacionais, enquanto os fundos mais sofisticados ficaram de fora.
Esse movimento revelou mais do que uma simples hesitação. Mostrou uma disfunção estrutural: a tendência a anunciar antes de consolidar, recuar antes de sustentar e improvisar onde deveria haver planejamento. É um padrão que atravessa governos e décadas, mas que, agora, assume contornos especialmente preocupantes diante da fragilidade fiscal do país.
O próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, admitiu que o recuo foi motivado por pressões do mercado financeiro. A confissão reforçou a percepção de desalinhamento entre as áreas técnica e política do governo na formulação de medidas relevantes. O episódio também escancarou a dificuldade de Haddad em manter o equilíbrio fiscal sem os instrumentos políticos necessários.
Nos bastidores, ficou evidente o dilema enfrentado pelo ministro: ao tentar preservar as contas públicas, deparou-se com resistência do Congresso Nacional e de setores do próprio governo. Em reunião com os presidentes da Câmara e do Senado, Haddad alertou que, sem os R$ 20 bilhões previstos com o aumento do IOF, o governo precisaria ampliar cortes no Orçamento, afetando inclusive o funcionamento da máquina pública. Mesmo assim, não conseguiu apoio parlamentar.
A demanda por medidas estruturantes é clara, mas sua implementação exige coragem política e base sólida, dois elementos que Haddad nem sempre tem à disposição, apesar de sua reconhecida capacidade técnica e do esforço permanente de diálogo.
Esse embate ocorre num contexto fiscal extremamente restrito. O novo arcabouço aprovado pelo governo limita o crescimento das despesas, enquanto a maior parte do orçamento segue comprometida com salários, aposentadorias e benefícios sociais. O espaço para investimentos e políticas públicas é praticamente inexistente.
Até o momento, a única ação de maior fôlego foi a aprovação da taxação dos fundos exclusivos e offshore, mas esse avanço é insuficiente diante de um sistema tributário ainda marcado pela regressividade e pela concentração de renda.
Persistir na lógica do improviso é manter o país estagnado. A condução da política fiscal não pode seguir sendo refém de pressões conjunturais e resistências políticas. Sem uma estratégia clara e uma visão de longo prazo, o Brasil continuará pagando caro: em oportunidades desperdiçadas, em crescimento comprometido e na perda de dignidade para os que mais precisam de políticas públicas eficazes.
O desafio, portanto, é romper com a cultura do improviso e construir uma política fiscal que concilie responsabilidade, planejamento e compromisso com o desenvolvimento sustentável do país. Até lá, a sensação de incerteza seguirá prevalecendo e custando caro.
Por: Genivaldo Coimbra
Marcelo Camargo/Agência Brasil